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segunda-feira, maio 25

O DESEJO DE IMAGENS NO COMERCIO DO MUNDO















Tomemos inicialmente as lojas de artigos de luxo fotografadas em Paris, na rua Saint-Honoré e em Saint Germain, ou ainda os novos shopping centers de metal e vidro ou os luxuosos hammams [casas de banho] de Ramallah, em território palestino. Objetos visíveis demais, não contrastados, apresentados de maneira similar, numa supremacia desmesurada do cenário, por vezes na "perfeição" de sua arquitetura, na tirania de suas formas purificadas. Mas no fundo, por trás da fascinação do belo objeto, há o espectro da cidade, aqui invisível. O enquadramento deixa de lado a maravilhosa confusão da cidade e exacerba a doce violência do comércio do mundo, a uniformidade das práticas de consumo no interior de espaços desencarnados.











Pois afinal nada é realmente diferente nos novos shopping centers internacionais, de Paris a Jerusalém e até Ramallah. O comércio é um mercado global e será fácil constatar que de Paris a Ramallah, terra no entanto arrasada, os citadinos compartilham o desejo de imagens, o mesmo desejo de consumo globalizado, desejo de "fazer parte do mundo". E são as mesmas arquiteturas internacionais que poderão ser encontradas em determinados locais do mundo que não são Berlim, na Europa, mas Ramallah, na Palestina, onde vivem elites transnacionais "entre dois mundos". Uma cultura global reinterpretada aloja-se nos territórios abertos ao capital e ao comércio, seguindo as lógicas urbanas, e faz emergir usos e formas urbanas que não são populares, tradicionais, mas remodeladas de acordo com os desejos universais. Evidentemente, essas novas atitudes urbanas não são sistemáticas e não se repetem para além dos locais designados da modernidade: o shopping center urbano, os hammam de primeira linha, as residências de luxo de Jerusalém às portas da Cidade Antiga e, mais surpreendente, de Ramallah, destinadas aos mesmos usuários transnacionais, sejam eles judeus ou árabes.









Lojas e outros espaços da vida cotidiana, de consumo e de cultura, deixam-se ler através do filtro das economias atuais, da circulação das idéias ou do capital. Mas o "belo" objeto pode evocar signos históricos, um dever de memória incorporada ou reatualizada numa arquitetura local mais ou menos erudita e sofisticada. O empreendimento arquitetônico operante nos museus, nas residências de luxo, lojas e outros objetos urbanos contém uma carga temporal: a da comemoração - como no Museu Judaico de Berlim, projetado por Daniel Libeskind, e no memorial de Yad Veshem em Jerusalém, dedicado ao Holocausto - e a da nostalgia patrimonial, que passa pela reabilitação de ruínas, transformadas em locais de consumo universais.













LE HAVRE, BERLIM, JERUSALÉM:
A CARTOGRAFIA DO MUNDO1


Sylvaine Bulle

traduzido do francês por Regina Salgado Campos

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